Foto ilustrativa de um casamento em Paracatu possivelmente no século XX. Foto: Olímpio M. Gonzaga [19–?]

Por: Carlos Lima (*Arquivista)

Um valoroso e truncado registro setecentista, cujo fim consistira em habilitar ao matrimônio dois escravos oriundos de localidades diversas, encontra-se preservado nas dependências do Arquivo Público Municipal Olímpio Michael Gonzaga e tem, dentre outras relevâncias, a de possibilitar uma maior compreensão sobre a formação do povo paracatuense.

O histórico documento principia-se com a inscrição “Anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil e setecentos e noventa e dous aos quatro dias do mês de Janeiro do dito anno neste Arraial de São Luis, e Santa Anna Minas de Paracatu Comarca da Manga Bispado de Pernambuco em o Cartório de mim escrivão ao diante nomeado e tendo ahi por partte do Capitão Tomaz Joaquim de Almeida Francisco por cabeça de sua escrava Roza”, para o fim de peticionar as proclamas de casamento dela com o também seu escravo Domingos cabra.  

Na folha 3 verso, do pretérito manuscrito, registra-se que “Com o favor de Deos querem casar Domingos Cabra natural e baptizado em Meia Ponte de Goyaz, Bispado do Rio de Janeiro e Rosa mulata natural, e baptizada na Vila de São João Del Rey Bispado de Mariana, ambos escravos do Capitam Thomas Joaquim de Almeida Francisco”, no então Arraial, hoje cidade de Paracatu.

Publicação das proclamas de casamento dos escravos Rosa e Domingos cabra

Aos 13 dias de Janeiro de 1792, o Reverendo Doutor Vigário Geral Carlos Dias de Carvalho deferiria, à folha 3 da referida petição, da seguinte maneira: “Julgo por boa a caução prestada [apresentada] como se achão feitas, as mais diligências necessárias, o escrivão passe o mandado de casamento na forma costumada. E pague V. Sa. as custas”. Estavam, portanto, bem encaminhadas as tratativas para aquela união, cujas proclamas dar-se-iam à publicação como de costume até aos dias de hoje.

Os autos encerrar-se-iam com os devidos proclames como se transcreve a partir da folha 3 verso, da seguinte forma: “Forão proclamados a [extação] da Missa conventual; em três dias não ouve pessoa alguma que faça juz aos impedimentos. Passa na verdade”. Estavam assim habilitados, aos 29 de dezembro de 1792, os escravos nubentes àquele matrimônio no então Arraial.

Vestígios como a presente proclamas de casamento de Roza e Domingos cabra, retratam fatos do período nefasto da escravidão no velho Arraial de São Luis e Sant’Anna das Minas do Paracatu e expõem aspectos sociais que resultaram na povoação e na formação da cultura locais, especialmente pela chegada de pessoas procedentes dos mais diversos lugares de Minas Gerais e de outras províncias.

(*) Carlos Lima é graduado em Arquivologia pela Universidade Federal da Bahia (UFBa), é Pós-Graduado em Oracle, Java e Gerência de Projeto e é conservador e restaurador de documentos. Elaborou este artigo a partir de suas pesquisas nos fundos documentais do Arquivo Público de Paracatu – MG.

Referência:

TRIBUNAL ECLESIÁSTICO. Proclamas de casamento de Domingos Braga e Roza. Cx. 25. 1792. 3 fls.

Nota: Imagens tratadas através de software do Portal MyHeritage in Color

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